Sunday, October 31, 2010

CMPANHA PARA A 2ª VOLTA DAS PRESIDENCIAIS BRASILEIRAS DE HOJE

A CAMPANHA ELEITORAL PARA A 2ª VOLTA DAS PRESIDENCIAIS BRASILEIRAS DE 31 DE OUTUBRO DE 2010

A campanha eleitoral para a segunda volta das presidenciais brasileiras, depois de Dilma Rousseff, candidata do PT de Lula, ter vencido sem maioria absoluta sobre o seu principal adversário, José Serra, do PSDB de Fernando Henrique Cardoso, a 3 de Outubro, foi tensa e dominada por um tom acusatório por parte dos dois candidatos.
Se as sondagens realizadas mesmo durante o primeiro período eleitoral, no caso de uma eventual segunda volta, terem dado a vitória de Dilma por 55% dos votos, ficando-se Serra pelos 38%, contabilizando-se os votos nulos ou brancos em 7%, as sondagens realizadas durante o segundo período eleitoral continuaram a dar a vitória a Dilma.
Segundo a sondagem do Ibope de 28 de Outubro, Dilma vence com 57% dos votos válidos, ficando Serra com 43%. Contando com os votos totais, o Ibope aponta a vitória de Dilma por 52%, ficando Serra com 39%, enquanto os votos brancos ou nulos se ficam pelo 5% e os indecisos somavam ainda 4%. Dos 3010 entrevistados, 82% afirmaram que o voto era definitivo, enquanto que 13% disseram que ainda poderiam alterar o seu sentido de voto.
Interessante notar que a campanha eleitoral esteve dominada pela questão religiosa em torno do aborto, pelo que institutos de pesquisa como o Datafolha, o Vox Populi, o Ibope e o CNT/Sensus dividiram, por diversas vezes, os entrevistados por religiões, demonstrando que Dilma recebe as preferências dos católicos, tanto praticantes (cerca de 54% dos votos) como não praticantes (com 55%), enquanto Serra reúne vantagem entre os evangélicos, com 44%, contra os 42% de Dilma, talvez em função das acusações em torno do aborto que recaíram sobre o tucano durante a campanha.
Na verdade, durante o segundo turno, os dois candidatos evitaram o tema do aborto, enquanto os sectores religiosos mais conservadores usaram-no como moeda de troca para dar o seu apoio. Nesta campanha, tanto Dilma quanto Serra apresentaram-se como paladinos de uma cruzada moralista contra a despenalização do aborto, embora, no passado, ambos se tivessem expressado em favor da abertura ao direito de as mulheres decidirem. Segundo Lula, se Dilma não venceu logo na primeira volta em função do caso Erenice Guerra, o facto deveu-se, também, como incansavelmente afirmou ao longo destes trinta dias de grande tensão na campanha eleitoral, ao debate em torno do aborto. Este tema é polémico na sociedade brasileira. É um dado relevante no maior país católico do mundo, e no qual o número de fiéis evangélicos cresce rapidamente que, segundo estudos realizados, uma em cada cinco mulheres brasileiras com menos de 40 anos já fez um aborto, sendo que destas, 88% afirmam-se religiosas.
De registar, ainda, que, de um modo geral, as sondagens destes últimos trinta dias deram sempre a preferência por Serra nas regiões Sul, Sudeste, Norte e Centro-Oeste, sendo a vitória de Dilma dada como garantida, esmagadoramente, nos estados do Sudeste e do Nordeste, sendo certo que o tucano adquiriria votos nas classes sociais mais instruídas e Dilma nas classes média e média-baixa.
Não obstante, pairou sempre, na opinião pública generalizada, a ideia de um empate entre os dois candidatos, porque os institutos de pesquisa haviam dado a vitória a Dilma logo na primeira volta e isso não sucedeu. Por outro lado, não obstante o voto ser obrigatório no Brasil, espera-se uma forte abstenção (que tem sempre de ser justificada), porque dia 2 de Novembro é feriado nacional e muitas famílias farão ponte na Segunda-Feira, passando o fim-de-semana prolongado fora dos respectivos círculos eleitorais.
Face a este cenário, o último dia de campanha, Sexta-Feira, dia 29, foi de grande importância, tendo os dois presidenciáveis encerrado as respectivas campanhas em Belo Horizonte, Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral do país. No último dia de horário eleitoral gratuito, no rádio e na televisão, ambos os candidatos apostaram num tom mais emotivo e, em alguma medida, festivo.
José Serra agradeceu aos eleitores, à família e à sua equipa de campanha, num tom comovente, com um novo vídeo clip do lema “Serra é do Bem”, o qual deu relevo à biografia e à trajectória do candidato a nível da vida política e, também, ao longo da campanha. Dilma apostou também num tom emotivo e na ideia da confiança na vitória. Explorou a despedida de Lula como presidente e apresentou cenas do aniversário de Lula – que, na Quinta-Feira, completou 65 anos de idade. Dilma apresentou ainda imagens do presidente pelo país e o programa eleitoral mostrou-a como uma “mulher pioneira”, enaltecendo as realizações do governo Lula-Dilma – vale lembrar que, já na campanha para a primeira volta, Lula atribuiu, a Dilma, os louros pelo sucesso de vários projectos de desenvolvimento económico que permitiram o avanço do Brasil, tanto interna, quanto externamente.
Importantíssimo, no último dia de campanha, foi o debate promovido pela Rede Globo entre os dois candidatos, com um formato totalmente diferente dos debates anteriores. Não houve perguntas entre os candidatos, tampouco a participação de jornalistas. O Ibope, a pedido da Globo, seleccionou 80 eleitores indecisos, que enviaram 5 perguntas cada um sobre os mais variados temas, da educação à saúde, ao meio ambiente, políticas sociais e outros. A Rede Globo escolheu, dentre essas, as 12 perguntas mais relevantes sobre cada tema e, no programa, os candidatos é que sortearam os eleitores, presentes no estúdio, e responderam às suas perguntas (com igual tempo para cada presidenciável, dois minutos, mesmo tempo destinado a réplicas e tréplicas e considerações finais). Os candidatos ficaram ainda com espaço para movimentar-se no estúdio. O PT, de início, reagiu a este formato, porque Dilma ainda se recupera da torção sofrida no pé direito, pelo que poderia ter dificuldades para caminhar, mas depois acabou por ceder.
Numa clara tentativa de evitar o clima de guerra que se havia instalado nos debates na segunda volta, os dois candidatos concentraram-se em responder aos temas propostos pelos eleitores indecisos, compondo, finalmente, um debate de propostas.
Acompanhado pela mulher e guru, a chilena Mónica, Serra levou também o baiano Jutahy Magalhães e o paulista Alberto Goldman, enquanto a comitiva de Dilma incluiu o gaúcho Marco Aurélio Garcia (assessor especial de Lula), a petista Marta Suplicy, o candidato a vice-presidente Michel Themer (PMDB) e Sérgio Cabral, o anfitrião (governador do Rio de Janeiro).
José Serra provocou subtilmente Dilma ao falar de corrupção e de inflação, referindo a sucessão de escândalos envolvendo políticos no país. Citando o “caso dos aloprados”, envolvidos na compra de dossiers contra a campanha de Geraldo Alckmin em 2006 (na sequência do qual ninguém foi condenado, não havendo sequer processo, apesar de a polícia ter apreendido 1,7 milhões de Reais), Serra fez referência indirecta aos escândalos na Casa Civil, mas ao contrário dos debates anteriores – nos quais o tucano sempre ressaltou as ligações entre a ex-ministra Erenice Guerra e Dilma – sem citar o PT, Dilma ou Erenice Guerra.
Salientando que a corrupção atingiu “níveis insuportáveis”, Serra propôs, como forma de combater as irregularidades, a necessidade de fortalecer as instituições fiscalizadoras, como o Tribunal de Contas da União e o Ministério Público. Serra concordou mesmo com Dilma quanto à necessidade de o Estado ampliar a sua participação na segurança pública, mas preferiu dizer que vai fortalecer a luta contra o contrabando de armas e drogas nas fronteiras e criar um Ministério da Segurança. Ainda relativamente a este tema, Serra defendeu a formação de um cadastro nacional de criminosos para que as forças de segurança dos estados possam monitorar a acção desses criminosos fora da sua área de abrangência. Dilma replicou, afirmando que esse cadastro já existe e que há iniciativas do governo para ampliar o banco de dados da Justiça e do sistema penitenciário.
Serra deu uma alfinetada em Dilma quando criticou a falta de infra-estruturas nas estradas rurais – que causa grande estrago à produção agrícola – e prometeu melhorar essa rede infra-estrutural.
Por outro lado, criticou também a política de saúde do governo, ainda que sem mencionar Lula, o que mereceu de Dilma o reconhecimento da existência de fragilidades no sector, o que a levou a prometer criar unidades de pronto atendimento que funcionem 24 horas por dia para desafogar os hospitais públicos.
Em matéria de políticas sociais, Serra defendeu a interligação entre o Bolsa Família e os programas federais como o Saúde Família, defendendo também a criação de mecanismos e estímulos para que as famílias não dependam da ajuda do governo, como o investimento no ensino profissionalizante.
Neste ponto, Dilma criticou o tucano ao referir que, em São Paulo, 300 mil famílias não recebem o Bolsa Família por falta de cadastramento (função que é do estado e dos municípios e não da União, sendo certo que Serra era governador de São Paulo até resignar para candidatar-se à Presidência). No fundo, disse ela, quem cuida dos pobres em São Paulo não é governo estadual, mas o governo federal.
Serra defendeu ainda a liberdade de imprensa, dizendo que ela é limitada no Brasil – embora a ONG Repórteres Sem Fronteiras tenha subido o Brasil da 71ª posição para a 58ª no seu relatório anual sobre o nível da liberdade de imprensa mundial, devido à evolução favorável da legislação no Brasil e dos passos positivos dados pelo país durante esta campanha eleitoral. Embora existam ainda casos de censura na imprensa, foi importante para este upgrade o facto de o Supremo Tribunal ter proibido as caricaturas dos candidatos, a inexistência de actos violentos contra jornalistas, a maior sensibilidade do governo relativamente ao acesso à informação e o facto de o Brasil ter uma das mais activas comunidades de internautas do mundo.
Por sua vez, Dilma, que no começo da campanha do segundo turno adoptara um discurso mais incisivo para barrar a eventual ascensão do adversário, também mudou de tom neste debate. Evitou mencionar o tucano, preferindo destacar as realizações do governo Lula, seu principal cabo eleitoral.
Questionada por um ex-agricultor gaúcho sobre projectos para a agricultura, a candidata do PT aproveitou para elogiar o Estado que a promoveu, afirmando que, durante o governo Lula, de cada dez tractores vendidos no Rio Grande do Sul, oito se destinaram à agricultura familiar.
Em matéria de segurança interna, Dilma prometeu melhorar as polícias Civil e Militar de todos os estados, expandindo a bolsa-formação (que hoje é concedida a 360 mil polícias) e através do reforço do policiamento comunitário nos bairros pobres.
Na réplica sobre a corrupção, Dilma destacou a actuação da Polícia Federal no combate aos casos de corrupção e apontou o papel da Controladoria Geral da União – órgão ligado à Presidência que foi responsável pela investigação no caso dos sanguessugas, quadrilha que desviava verbas do Ministério da Saúde.
Dilma defendeu, ainda, a desoneração da folha de pagamentos no país para aumentar a criação e formalização de empregos. Serra foi cauteloso e discordou, perguntando o que iriam retirar aos Brasileiros: o INSS? O Fundo de Garantia?
Como o formato do debate não permitiu que os candidatos fizessem perguntas um ao outro, este foi o debate mais produtivo desta campanha para a segunda volta, chegando a petista e o tucano a destacar, em consonância, a necessidade de valorizar os salários dos professores das escolas públicas e reforçar o Sistema Único de Saúde.
Os candidatos deixaram de lado expressões fortes como “farsa”, “entreguismo”, “quadrilha” e outras, bem como as acusações de corrupção e as denúncias, que entupiram esta campanha, e debruçaram-se sobre temas do quotidiano num tom ameno, para dar prioridade aos temas e não aos pecados de cada um. Não houve, neste sentido, questões polémicas sobre privatizações, pré-sal e legalização do aborto, assuntos que foram destaque nesta campanha tensa e acirrada. Até porque ambos os candidatos sabem bem que eleitores indecisos não gostam de posturas bruscas.
O resultado final deste debate frio foi o de um Serra ligeiramente no ataque (mas sem exaltação), fazendo críticas à rival e ao governo de forma indirecta, e uma Dilma na defensiva, preferindo destacar as realizações do presidente Lula. No fundo, um “zero a zero”, bom para quem joga pelo empate.
De notar que os resultados eleitorais só começarão a ser divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a partir das 19h00 (hora de Brasília), apesar das eleições decorrerem entre as 8h00 e as 17h00. O problema que leva a atrasar em duas horas o período de apuramento é o horário de Verão e a diferença de fuso no Brasil.
Por isso, as pesquisas eleitorais de boca de urna só poderão ser divulgadas depois das 19h00, sendo que o TSE espera que a apuração de todos os votos esteja encerrada à meia noite.
Na primeira volta, as primeiras parciais começaram a sair às 18h00 e, perto das 20h30, cerca de 90% dos votos estavam já apurados. Agora, em termos relativos tendo em conta o horário de Verão e o fuso do Brasil, o apuramento será mais rápido por envolver apenas a disputa para presidente e governador dos Estados.

Wednesday, October 27, 2010

MORRE, AOS 60 ANOS, O EX-PRESIDENTE ARGENTINO NÉSTOR KIRCHNER

Morreu, nesta Quarta-Feira, 27 de Outubro de 2010, por volta das 10h00, Néstor Kirchner, ex-presidente de Argentina e marido da actual chefe de Estado, Cristina Fernández Kirchner, vítima de ataque cardíaco.
"Foi uma morte súbita. Vai ser divulgado um boletim médico", disse Luis Buonomo, médico de Kirchner, em entrevista.
Kirchner morreu depois de ter sido internado de emergência por problemas cardíacos no hospital José Formenti, na cidade de El Calafate, na província de Santa Cruz (Sul da Argentina, na região da Patagónia), berço político do casal Kirchner. Segundo a imprensa local, os Kirchner descansavam na residência da família na cidade desde o fim-de-semana.
Embora jovem, com apenas 60 anos, a verdade é que os problemas de saúde do ex-presidente e deputado não eram novos. Em 2004, Kirchner teve um crise gástrica derivada da síndrome do cólon irritável. Em Fevereiro, foi submetido, de urgência, a uma cirurgia de alta complexidade para desobstruir a artéria carótida direita. Em meados de Setembro, foi submetido a uma angioplastia coronária, um procedimento para a dilatação de uma obstrução ou estreitamento das artérias do coração, depois de ter sido internado com dores no peito. De acordo com nota divulgada pelo governo à época, o procedimento, que incluiu a colocação de uma prótese metálica que, posicionada no interior de artérias coronarianas obstruídas, normaliza o fluxo sanguíneo local, foi um sucesso.
O chefe de gabinete do governo da Argentina, Aníbal Fernández, e outros funcionários da Administração Cristina Fernandez partiram para El Calafate por conta da morte súbita de Kirchner, enquanto dezenas de pessoas se reuniram em frente à Casa Rosada, à espera de notícias.
A imprensa local informou que o corpo de Kirchner pode ser levado para Buenos Aires para o funeral, mas ainda não há confirmação desta possibilidade.
Entretanto, líderes latino-americanos lamentaram já a morte do ex-chefe de Estado argentino. O presidente venezuelano, Hugo Chavez, enviou uma mensagem de pesar a Cristina Fernández Kirchner, que dizia: “Ai, minha querida Cristina...Quanta dor! Que grande perda sofre a Argentina e a nossa América! Viva Kirchner para sempre!!”. O presidente do Paraguai, Fernando Lugo, afirmou-se impressionado com a morte de um "companheiro e amigo na construção de uma América Latina sem exclusões". O recém-empossado presidente colombiano, Juan Manuel Santos, também lamentou o falecimento de Kirchner, dizendo que "é uma grande perda para a Argentina e para o continente", pedindo um minuto de silêncio em homenagem ao colega.
Néstor Kirchner nasceu a 25 de Fevereiro de 1950 em Río Gallegos, na província de Santa Cruz, na região da Patagónia. Advogado, foi intendente de Río Gallegos (1987-1991) e governador da província de Santa Cruz (1991-2003) pelo Partido Justicialista, que liderava.
Presidente da Argentina de 2003 a 2007, a sua passagem pela Casa Rosada ficou marcada pela consolidação da recuperação económica do país, depois de uma forte crise económica e política nos anos anteriores, tendo também contribuído para a reunificação do Partido Justicialista, que enfrentava séria crise interna.
Nas eleições de 2007, Kirchner escolheu, para sucedê-lo na Casa Rosada, a mulher, Cristina Fernández Kirchner, com quem se havia casado em Março de 1975. Por essa via, continuou mantendo grande influência no governo. Na verdade, Kirchner era o principal aliado e conselheiro de Cristina e, apesar do desgaste sofrido pelo governo desta nos últimos anos, esperava-se que ele se viesse a candidatar novamente à Presidência nas eleições do próximo ano, quando terminasse o mandato de Cristina, naquilo que aqui, quando falámos da vitória eleitoral de Cristina Kirchner e sua tomada de posse (em artigos de Janeiro de 2007), já havíamos denominado de «dinastia Kirchner», que levaria os Kirchner a ocupar a liderança da Argentina de 2003 a 2015, pelo menos.
Em 2009, ele foi eleito deputado pela Província de Buenos Aires, com mandato até 10 de Dezembro de 2013. Desde o dia 4 de Maio de 2010, Néstor era Secretário-Geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasul).

Saturday, October 9, 2010

REUNIÃO DO MERCOSUL

REUNIÃO DO MERCOSUL

Na reunião de técnicos dos quatro Estados-membros do Mercosul, que decorreu esta semana, em Manaus, o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que o Mercosul é visto como prioridade para o governo brasileiro, ainda para este ano.
Neste sentido, os governos do bloco estão a negociar aspectos importantes para a evolução do mesmo, aprofundando a integração, tendo o Brasil, que detém, neste semestre, a Presidência temporária do Mercosul, proposto uma medida simbólica, segundo a qual Argentinos, Paraguaios, Uruguaios e Brasileiros possam passar pelas alfândegas de cada Estado-membro pelos guichés reservados aos passageiros nacionais, como sucede na União Europeia (EU). Infelizmente, a medida, proposta pelo governo brasileiro, continua a esbarrar em resistências no Ministério na Justiça, não se prevendo, portanto, que venha a ser adoptada para breve.
Um aspecto importante que foi discutido na reunião foi a aprovação da medida que impõe o fim das excepções à Tarifa Externa Comum (TEC), como aliás ocorre também na EU, tendo sido esta, igualmente, uma proposta brasileira. Os Argentinos foram mais além, propondo algo mais amplo para a integração de políticas comerciais e económicas dos quatro Estados-membros, incluindo a criação de um banco regional de desenvolvimento e programas de desenvolvimento da ciência e tecnologia.
Facto é que irão surgir dificuldades para a implementação do fim das excepções à TEC, bem como para o fim da chamada «dupla cobrança», para evitar que, como sucede ainda hoje, os produtos que já pagaram a TEC continuem a ser obrigados a pagá-la novamente quando passam na fronteira de um Estado-membro do Mercosul. Celso Amorim foi mesmo adiantando que, seguramente, será necessário manter as excepções à TEC para os bens de capital, sector nos quais têm surgido, por parte de todos os sócios, as maiores restrições.
Certo é que os empresários brasileiros estão preocupados com a barreira nos mercados da América do Sul e com as ameaças aos seus negócios na Venezuela. Amorim procura acalmar os ânimos clamando pela necessidade de esperar-se que o período eleitoral e pós-eleitoral passe no país vizinho, para que depois se analisem essas questões. Além do mais, confrontado constantemente com as preocupações do sector de máquinas e equipamentos sobre o risco de perda de mercado com as nacionalizações feitas pelo governo venezuelano, Celso Amorim afirma que o comércio entre os dois países tem crescido e que o Brasil está, e continuará, quanto a nós, a estar, ligado a projectos de desenvolvimento locais.

Friday, October 8, 2010

PARCERIA BRASIL-FRANÇA NO NEGÓCIO DAS ARMAS

PARCERIA BRASIL-FRANÇA NO NEGÓCIO DAS ARMAS
Segundo relatório divulgado, esta semana, pelo Ministério francês da Defesa, o Brasil é, hoje, o maior importador de armas da França. O Brasil passou do 9º lugar que ocupava em 2008-2009 para o primeiro lugar no ranking mundial, à frente de países como a Arábia Saudita e a Índia, parceiros tradicionais da França em questões de armamentos.
Na contabilização, está certamente a compra, pelo Brasil, dos submarinos franceses Scopèrne, já que os caças Rafaele não podem ser avaliados, uma vez que o governo brasileiro ainda não assinou o contrato de compra com a França. Embora o ministro brasileiro da Defesa, Nelson Jobim, desejasse assinar já esse contrato, para manter a parceria Brasil-França, a verdade é que a decisão é do presidente Lula que, tendo ainda como opção também modelos de caças norte-americanos e suecos, já afirmou que a decisão sobre a questão será tomada pelo presidente que, vencendo o pleito de 31 de Outubro, tomará posse a 1 de Janeiro de 2011.

RELAÇÃO EU-BRASIL: ALGUMA EVOLUÇÃO

RELAÇÃO EU-BRASIL: ALGUMA EVOLUÇÃO

A EU e o Brasil assinaram dois novos acordos, nos dias 7 e 8 de Outubro de 2010, na reunião dos ministros do Interior da EU, realizada no Luxemburgo. Segundo esses acordos, que vêm resolver uma questão pendente desde Abril de 2008, passa a existir a isenção mútua de vistos para períodos de curta duração entre o Brasil e os países que integraram a EU em 2004.
Enquanto os cidadãos brasileiros podiam viajar por todos os Estados-membros da EU, o Brasil continuava a exigir vistos aos turistas oriundos de Malta, Chipre, Estónia e Letónia. Estes acordos estendem o pacto de reciprocidade da não necessidade de vistos a estes quatro Estados-membros da EU, sendo que entrarão em vigor em Fevereiro de 2011, permitindo aos Europeus a entrada, no Brasil, sem vistos, para o carnaval brasileiro. Sendo certo que a Grã-Bretanha e a Irlanda, que não estão incluídas nos acordos, continuam a exigir vistos de entrada de Brasileiros nos respectivos territórios, mesmo que de curta duração.
As viagens de curta duração, que representam cerca de 90% das viagens de Europeus ao Brasil, incluem visitas turísticas, familiares ou profissionais sem remuneração, que durem entre 3 a 6 meses.
A reunião de dois dias do Conselho de Ministros do Interior da EU aprovou ainda uma directiva comunitária no sentido de regulamentar a entrada e permanência de trabalhadores de Estados não membros da EU que sejam transferidos, para território da EU, por empresas, ou que forem contratados para trabalhos temporários. Situações que afectam muitos Brasileiros que transitam pelo espaço da Europa Comunitária.
Assim se dá mais um passo no sentido de se aprofundar o relacionamento entre o Brasil e a EU, morno desde a assinatura da parceria estratégica em Julho de 2007. Mas, ainda assim, bastante mais quente que o relacionamento EU-Mercosul, parado desde 2004, num evidente sinal de crise profunda do multilateralismo, que tem levado os Estados e os restantes actores das relações internacionais, a priorizar os relacionamentos bilaterais.

O VOTO ELECTRÓNICO - UMA TECNOLOGIA BRASILEIRA

VOTO ELECTRÓNICO, UMA TECNOLOGIA BRASILEIRA


No dia 3 de Outubro, os mais de 135 milhões de eleitores Brasileiros foram chamados às urnas para eleger um novo presidente, os governadores dos estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores. Terão de ir a votos, novamente, no dia 31.

O processo de eleição é simples e é produto da tecnologia brasileira: o voto electrónico, que permitiu que, tendo as urnas encerrado às 17h00 hora de Brasília (21h00 em Portugal), os resultados estivessem já apurados às 21h00 locais (01h00 em Portugal).

Trata-se de um computador responsável pelo armazenamento de votos durante a eleição: a urna electrónica. Este dispositivo foi desenvolvido no Brasil em 1996, quando foi pela primeira vez utilizado em eleições municipais. O computador apresenta três teclas: confirma, corrige e branco (para votar em branco), que o eleitor aperta depois de inserido o número de código do candidato escolhido. Se o eleitor pretender anular o voto, basta digitar um número de candidato inexistente e teclar confirmar.

Existe muita polémica sobre o voto electrónico. Desde os anos 1980, ainda no regime militar, se vem pensando sobre a questão. A ideia ganhou força a partir de pesquisas realizadas pela Justiça Eleitoral para tornar mais fácil o processo de votação e apuração dos resultados.

Os responsáveis pelo projecto da eleição informatizada foram engenheiros e pesquisadores ligados ao Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. O projecto foi concretizado por uma empresa brasileira, a OMNITECH Serviços em Tecnologia e Marketing.

A implantação do voto electrónico dificulta algumas das antigas e comuns fraudes externas da votação em papel: o «voto formiguinha», pelo qual um eleitor recebia uma cédula já marcada e devolvia a que lhe era entregue pelo mesário para que esta, uma vez marcada, fosse entregue a outro eleitor; a marcação, pelo escrutinador, das cédulas em branco; a adulteração do voto; a contagem dos votos de um candidato para outro; o falseamento das actas e dos mapas eleitorais; o falseamento das totalizações, entre muitas outras.
Na realidade, a corrupção eleitoral sempr
e foi um mal do sistema eleitoral brasileiro e o aperfeiçoamento desta legislação foi o mote da campanha que descredenciou Júlio Prestes e levou à vitória dos revolucionários de 1930. Até à aplicação do voto electrónico, quase nenhuma eleição escapava ao fantasma da fraude, comummente utilizada pelos candidatos não eleitos para justificar as suas derrotas.

A criação da Justiça Eleitoral em 1932 foi, naturalmente, um passo importante nesse processo e é tida como um marco fundamental na história do sistema eleitoral no Brasil. Desde então, todo o processo, desde o recenseamento eleitoral à proclamação dos eleitos, cabe à Justiça Eleitoral.

Mas tal não parece suficiente. Segundo diversos pesquisadores e peritos em questões eleitorais, o processo de voto electrónico também pode dar azo a fraudes e manipulação dos resultados eleitorais. Vejamos. A eleição informatizada processa-se do seguinte modo: antes do dia da eleição, são colocados os programas nas máquinas; no dia da eleição, o presidente da mesa liga a urna e digita uma senha para activá-la; é então impressa uma lista com o nome de todos os candidatos, demonstrando que todos têm zero votos; no final do dia, os resultados da votação de cada urna são gravados em disquete e é impresso um boletim de urna com a totalização, por candidato, de cada urna; as disquetes são depois levadas para os locais de apuração de cada estado, de onde os dados são transmitidos, em rede, para os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e, daí, para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Note-se que cada disquete te uma «identidade própria» que é verificada pelo computador da Justiça Eleitoral. Essa «identidade» é secreta e criptografada.

Os receios surgem, justificados ou não, porque teme-se que os programas possam ser alterados no final de Agosto (quando, por exigência legal, os programas são expostos aos fiscais dos partidos) ou quando os programas são introduzidos nos computadores. Outro receio é o de que a fraude se dê no transporte dos programas da rede de informática do TSE para os TREs e para as Zonas Eleitorais. O processo de votação electrónica também ganha alguns cépticos porque quem controla o programa que protege os dados inseridos nas disquetes e o transporte dos dados até ao local final de apuração dos votos é a governamental Agência Brasileira de Informação (a célebre ABIN) e quem controla o processo de codificação dos dados (criptografia) é o Centro de Pesquisas em Segurança das Comunicações (Cepesc), que está ligado à ABIN.

A grande vantagem da votação informatizada, segundo Jairo Nicolau, pesquisador do Iuperj, e David Fleischer, do Departamento de Ciência Política da UnB, é a redução dos votos nulos ou em branco, essencialmente porque as cédulas eram demasiado complexas para a elevada percentagem de analfabetismo no Brasil. A combinação destes dois factores, a cédula complicada e o analfabetismo, conduzira sempre a um elevado número de votos nulos nas eleições anteriores à utilização da urna electrónica. Por outras palavras, David Fleischer aponta que, nas eleições para vereador em 1996 e 2000, a proporção de votos válidos subiu de 86,49% para 93,91%, enquanto os votos em branco e nulos diminuíram de 13,51% para 6,09%.

O procedimento informatizado das eleições brasileiras é tão interessante que tem captado a atenção de vários países. Para além de, no pleito do dia 3, terem estado presentes 150 observadores internacionais, oriundos de 36 países, não para fiscalizar o processo eleitoral, mas para aprender com ele, a urna electrónica já foi utilizada no Paraguai, na Argentina, no Equador e na Costa Rica, ainda que tenha sido proibida na Holanda (em Maio de 2008) e na Alemanha (em Março de 2009) por alegada falta de segurança.

Wednesday, October 6, 2010

DILMA: O QUE SE PODE ESPERAR?

DILMA: O QUE SE PODE ESPERAR?

Dilma Rousseff não conseguiu obter a maioria absoluta de que necessitava para fazer eleger-se na primeira volta das presidenciais do Brasil de 3 de Outubro de 2010. Ficando-se pelos 47%, José Serra, seu principal concorrente obteve 32% e Marina Silva, do Partido Verde alcançou 19% dos votos válidos, tendo sido considerada a grande vencedora do pleito.
Na realidade, constante nos 8-9% entre Abril e o início de Setembro, Marina subiu para 12% em meados de Setembro, chegando a alcançar, segundo sondagem divulgada a 28 de Setembro, 17% das intenções de voto, pelo que não é de admirar o resultado que obteve nas eleições. Com um discurso ambientalista, que atinge a classe média alta, ambientalmente consciente, foi aí que Marina mais capou votos. Por outro lado, se a candidatura de Dilma foi «feita» por Lula e se o eleitorado de Serra vota nele por se ter habituado a votar PSDB ou por ser contra o PT, Marina trouxe, de facto, algo de novo. Os problemas de Marina foram, todavia, a estrutura do seu partido, demasiado frágil, e o facto de o seu programa de campanha apresentar propostas de longo prazo.
Se a vitória de Dilma era dada como certa logo na primeira volta, a verdade é que a popularidade da candidata veio decrescendo nos últimos dias de campanha, ainda que eu ainda esperasse uma vitória logo em primeiro turno. Até porque as sondagens, num país com 190 milhões de habitantes, com mais de 8 milhões e 500 mil Km2 (para se ter uma ideia, Portugal tem 92 000 Km2), em que São Paulo é do tamanho da Itália e o estado do Rio de Janeiro do de Portugal, valem o que valem e as margens de erro acabam por ter alguma expressividade. Mas a vitória na segunda volta de 31 de Outubro é certa.
Tendo escolhido, como lema de campanha, «dar continuidade ao governo do Presidente Lula», Dilma não deverá introduzir grandes alterações ao Brasil que herdará. Em todos os quesitos, do social ao económico, passando pela política externa. Apenas uma mudança de estilo é esperada. Esta com algum vigor.
Desde logo, a prioridade será dada às questões internas, já que Dilma não tem a tradição internacionalista do PT e de Lula, não sendo de se prever que venha a levar a efeito uma diplomacia presidencial como o fizeram Lula e Fernando Henrique Cardoso. A preocupação central de Dilma é o desenvolvimento social do país, apostando a ainda candidata na distribuição da renda, no aumento do emprego e na melhoria do saneamento, da habitação e da educação, tendo já afirmado que terá mais cuidado em especificar as suas promessas eleitorais, demasiado vagas na campanha para a primeira volta.
Em matéria de composição do novo governo, espera-se que este venha a ser muito eclético, com uma base de suporte que irá do PT, ao PP, ao PCdoB, passando pelo incontornável PMDB – o maior e mais constante vencedor das eleições estaduais e legislativas. Por uma razão muito simples: como não apresenta candidato à Presidência da República desde 1984, as negociações e as compensações em troca de apoios rendem-lhe sempre posições favoráveis e confortáveis, designadamente ao nível de grandes pastas do governo. Este facto é tanto mais verdadeiro quanto, em nome da nomeação de Dilma, Lula teve de conceder compensações. Afinal, enquanto Lula é fundador do PT, Dilma só se filiou no partido em 2001, o que constituiu um motivo forte para que muitas lideranças do PT criassem barreiras à indicação de Dilma. De alguma forma, Dilma terá sido «imposta» por Lula ao PT, sem possuir, nem capital político, nem o carisma de Lula. Além da margem de aprovação popular de Lula de 80%, segundo as últimas sondagens, Dilma nunca disputara antes qualquer pleito, enquanto Lula já se candidatara a presidente três vezes antes de ser eleito em 2002.
Estas condicionantes seguramente limitarão os alcances do PT na composição do governo, onde se espera vir a ter uma participação menor. Ainda assim, cogitam-se, para a pasta da Fazenda, António Palocci, Guido Mantega ou Luciano Martinho. O que demonstra, claramente, a intenção, já muito anunciada por Dilma, de seguir o caminho da continuidade relativamente à Administração Lula. Em relação à Fazenda, de qualquer forma, quer ela, quer mesmo Serra, pouco poderiam inovar. Para além do próprio Serra ter tecido rasgados elogios a Lula durante a campanha eleitoral, não sendo de esperar que elaborasse grandes alterações, o Brasil tem regras relativas aos fluxos financeiros que tem de cumprir. E se já a política económica de Palocci e, depois, de Mantega, fora idêntica à de Pedro Malan do governo FHC, para os próximos quatro anos o cenário manter-se-á inalterado, com o Brasil a manter a sua grande performance em termos económicos. Note-se que, nos primeiros meses deste ano, o crescimento económico do Brasil foi de 8%.
Ademais, o sistema político brasileiro difere dos modelos anglo-saxónicos. Nestes, para que o candidato vença, tem de apregoar a mudança. No Brasil, a vitória é assegurada se apelar à continuidade. O que aliás explica a preferência do eleitorado por Dilma, ainda que, se esta está na sombra de Lula, o mesmo se pode dizer de Serra, para o qual atacar o ainda presidente seria dar um tiro no próprio pé. Não esquecer, ainda, que o vice-presidente será do PMDB. O anterior vice-presidente, José de Alencar, empresário, era uma personalidade controversa e, ademais, oriundo de um partido pouco expressivo. Ao contrário, Michel Themer está bem posicionado. E deixará o PT em sérias dificuldades no caso de ter de assumir no lugar de Dilma que, embora tenha sido já dada como curada, persistem dúvidas quanto à sua capacidade física para liderar o Brasil herdado de Lula.
No entanto, para a pasta das Relações Exteriores, fala-se muito da manutenção de Celso Amorim ou da sua substituição por António Patriota. Nestes casos, a continuidade da política externa será a tónica dominante. Todavia, também se fala do do ex-Secretário Geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, do PT, que abandonou o cargo por ter completado 70 anos. Mas para ser ministro não existem limites etários. Neste caso, a radicalização da política externa brasileira será uma realidade, por ser uma personalidade controversa, em função das posições radicais que defende, tendo mesmo insistido na questão da bomba atómica. Neste cenário, espera-se a formulação e execução de uma política externa que siga o caminho traçado por Lula, de uma forte presença nas questões internacionais, ainda que em menor grau, em virtude de Dilma ser muito mais nacionalista que Lula.
Efectivamente, Lula trouxe, para a prática política brasileira, algo que não acontecia: a participação do partido na formulação e execução da política externa brasileira. É verdade que o próprio PT tem uma tradição internacionalista significativa, o que não sucede com os restantes partidos e, por outro lado, que Marco Aurélio Garcia sempre influenciou muito o presidente cessante. Assim, o internacional sempre foi uma área de eleição para Lula. Ainda que o internacionalismo do partido se limitasse à actuação na América Latina, durante as Administrações Lula o PT desenvolveu uma visão de mundo abrangente, actuando nos mais diversos fora mundiais, embora privilegiando a cooperação Sul-Sul, que relançou, não apenas com os países emergentes, com também com os países mais pobres, sobretudo da África. Cooperação Sul-Sul essa que, trazida pelo PT, apresentou desde logo dois instrumentais: a expansão da influência do Brasil e consequente prestígio internacional e a dimensão da solidariedade, resultante da visão internacionalista do partido e do próprio Lula. Dilma é diferente. Muito menos internacionalista que Lula, ela é sobretudo nacionalista, daí que, embora sem grandes alterações, se espere uma diminuição da actuação internacional do Brasil, que seguramente deixará de ser tão abordado ao nível dos media internacionais.
É natural que o papel do Brasil como pay master na América do Sul seja diminuído. As negociações com o Paraguai e a Bolívia seguramente não piorarão, mas não se prefigura provável uma melhoria das mesmas. O Brasil seguirá, certamente, consolidando a manutenção da sua presença nos principais fora internacionais, defendendo, principalmente, um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Simplesmente, fá-lo-á de um modo low profile.
Relativamente à política externa formulada para o espaço regional, o Brasil continuará a encarar a América do Sul como sua área de influência, sendo certo que esta tarefa, mesmo com Lula, tem sido facilitada pelo facto de os próprios EUA não terem uma política externa para a América Latina consistente e bem definida. Na América do Sul, os EUA contentam-se com a Colômbia e a Venezuela, agradecendo que o Brasil se dedique a promover a estabilidade da região Sul. Assim, é de se esperar a manutenção da postura de Lula face à Venezuela e à Bolívia e, ainda, em relação à defesa dos direitos humanos na região.
Também em relação ao Mercosul não se esperam grandes alterações. Facto é que a presença do Brasil no bloco impede que o país assine acordos comerciais de forma bilateral, sendo a expressão do Mercosul neste aspecto muito insignificante. O bloco apenas tem dois acordos de comércio assinados, com Israel e o Egipto – países, além do mais, de pouca expressividade económica – enquanto as negociações com a EU se mantêm num impasse desde 2004, em função da falta de acordo quanto à insistência da EU em manter o proteccionismo da Política Agrícola Comum, ao que o Mercosul responde com a não abertura dos mercados públicos e dos serviços.
A UNASUL, importante fórum de debate na América do Sul, também não verá grandes alterações da postura brasileira. A UNASUL é relevante, designadamente, para criar uma segurança comum face aos EUA, servindo, ao Brasil, para exercer influência sobre vizinhos como a Venezuela e a Bolívia. A organização, criada em 2008, serve, essencialmente, para estabelecer uma agenda de segurança comum, ainda que o Brasil não represente, para a região, qualquer perigo militar. O receio dos vizinhos face ao Brasil continuará a ser a forte presença económica do país, o que tem motivado as posições radicais, por exemplo, da Bolívia, de nacionalizar importantes sectores económicos onde o Brasil tem fortes investimentos, como a petrolífera brasileira Petrobrás.
Na Organização dos Estados Americanos, o Brasil seguirá buscando alguma influência, designadamente através da escolha de secretários-gerais, sendo ainda de se esperar a manutenção da consolidação da influência do Brasil no Haiti e, de alguma forma, nas Caraíbas.
Face aos EUA, o pragmatismo continuará sendo a tónica dominante, até porque a política externa brasileira para os EUA é constante desde Ernesto Geisel.
Relativamente ao Médio Oriente, e porque o Brasil não tem uma linha bem estruturada de interesses económicos, serão de esperar algumas alterações.
A grande dificuldade de Dilma será «lutar» contra um presidente anterior que termina o seu segundo mandato com um índice de popularidade de 80%, que alcançou êxitos incontornáveis ao nível económico, das políticas sociais, tendo o Bolsa Família alcançado 11 milhões de famílias, e do estatuto internacional do país. Como poderá Dilma diferenciar-se de Lula? Que estratégia adoptar depois de o Brasil ter sido liderado pelo presidente mais famoso do mundo, como disse Obama? Dilma terá o desafio de ter de ser melhor. Mas não tem o carisma de Lula, e isso repercutir-se-á na imagem internacional do Brasil, sendo de esperar que a comunicação social mundial fale menos do Brasil e lhe dedique menos manchetes. Isto leva, também, a uma outra interrogação. Embora se fale muito, hoje em dia, sobre o ingresso de Lula numa carreira internacional, designadamente nas Nações Unidas, a falta de instrução de Lula, que não sabe falar Inglês, poderá ser um handicap, surgindo a questão de se saber se não estará Lula a preparar o seu regresso como presidente em 2014, já que a Constituição Brasileira limita a presença de um presidente a apenas dois mandatos, sendo certo que Lula não quis, deliberadamente, alterá-la para poder reeleger-se a um terceiro mandato. Neste caso, Dilma seria uma espécie de «presidente de transição», ou, o que é ainda pior, algo como um governo Lula «disfarçado» de Dilma.
É evidente que Dilma beneficia da «reputação de mudança» de Lula, que trouxe a mudança, designadamente em termos de política externa, melhorando a imagem internacional do Brasil. Se analisarmos a evolução da política externa brasileira desde o primeiro mandato de FHC até ao final da era Lula, concluímos facilmente que ela mudou extraordinariamente. Todavia, não houve qualquer ruptura, como sucedeu na Argentina, que assistiu a rupturas sucessivas de Menem para Alfonsín e deste para Kirchner. A política externa do Brasil foi-se alterando, no que podemos apelidar de «ruptura lenta e continuada». O primeiro mandato de Lula desenvolveu uma política externa muito semelhante à de FHC, vindo depois a modificá-la, para chegar-se ao ponto de total diferença a que hoje assistimos.
Neste sentido, quais as expectativas gerais para a política externa de Dilma? Seguramente, ela será menos «aventureira», ainda que Dilma apoie a política de Lula relativamente ao Irão, mais cordial e menos tensa face aos EUA, sendo menos assertiva nas questões comerciais, em relação às quais se esperam poucos avanços. Ainda assim, os EUA e a EU continuarão sendo as suas prioridades, objectivando a conclusão de acordos comerciais, sem alterações relativamente a esses parceiros e, ainda, sem mudanças face a Portugal. A haver alterações, talvez estas sejam mais visíveis em matéria de cooperação para o desenvolvimento, já que Dilma é mais desenvolvimentista e está mais preocupada com a situação económica interna do Brasil, o que poderá levar, não só à diminuição da cooperação técnica com a África, como ainda a uma política menos preocupada com as questões ambientais. Ela quer desenvolver a economia e melhorar a situação interna do Brasil, alegando o velho argumento do «direito ao desenvolvimento», sem grandes preocupações ambientais.
É verdade que, se historicamente há uma tradição do Ministério das Relações Exteriores de manter a continuidade da política externa brasileira assente num autonomismo que, todavia, foi conhecendo períodos de excepção, hoje esta tendência para a autonomia é muito significativa. Existem, de facto, duas correntes, no interior do Itamaraty, especialmente em relação à forma como pode a política externa obter insumos para o desenvolvimento nacional.
De um lado, temos os autonomistas, que hoje controlam o Ministério, defendendo uma revisão da ordem internacional para torná-la mais favorável ao Brasil. De outra parte, temos os institucionalistas pragmáticos, que vêm nos regimes internacionais e na organização internacional uma estrutura adequada para a política externa brasileira, pelo que defendem a não necessidade de alterar a sociedade internacional, bastando que o Brasil a ela se adapte. Esta visão é hoje minoritária, tendo sido a corrente que, dominando FHC e Celso Lafer, apoia José Serra. Dilma, pelo contrário, recebeu o apoio dos autonomistas e, embora a campanha eleitoral não se tenha grandemente orientado pelo tema da política externa, este é hoje fundamental para o Brasil, já que, não obstante todos os êxitos de Lula, a verdade é que, não só ele beneficiou da situação económica preparada pelo seu antecessor, pai do Plano Real, como também da conjuntura internacional favorável aos países emergentes, Lula é um fenómeno bem conseguido de marketing internacional. E muito da sua actual popularidade se deve à circunstância de ter colocado o Brasil na cena internacional, abrindo caminho à concretização da obsessão do país em tornar-se uma potência.

Sunday, October 3, 2010

Entrevista concedida ao Site SAPO ONLINE

Como os portugueses vêem os brasileiros em Portugal?

Integrados, sim, participativos, sim, com melhor nível de vida, sim. Em todos os outros tópicos, como qualificações laborais, credibilidade e fenómenos de marginalidade, os respondentes ao inquérito online SAPO/Netsonda deram respostas maioritariamente negativas.

São bons trabalhadores? Estão integrados? Vivem melhor em Portugal do que no Brasil? Estas foram algumas das questões que o inquérito online SAPO/Netsonda colocou ao longo da semana e que recolheu 5318 respostas.

O primeiro grupo de questões prendia-se com integração no mundo do trabalho. 49 % dos respondentes consideraram que os brasileiros não são bons trabalhadores contra 38% que os vêem como bons trabalhadores. Sobre o grau de qualificações, as respostas são mais extremadas: 74% responde que não são qualificados e apenas 14,2% consideram o inverso.

Para a professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), Raquel Patrício, doutorada em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília, “esta avaliação expressa muito bem a percepção existente sobre a comunidade brasileira ou sobre o brasileiro médio”. Explica porquê: “Há 20 anos, a imigração brasileira para Portugal era qualificada, situação que se alterou com o fluxo massivo de cidadãos brasileiros que escolheram Portugal como destino nos anos 90, muito impulsionados pelas dificuldades no país natal decorrentes do Plano Real e atraídos pelo Portugal da Europa e do euro. Um país que fala a sua língua e que tem um clima, apesar de tudo, mais semelhante que a maioria dos países europeus”.

Nessa primeira grande vaga, Portugal assemelhava-se a uma espécie de El Dorado, afirma a investigadora, e a caracterização demográfica era muito assente em pessoas de baixo rendimento e elevada mobilidade, à qual se seguiu uma segunda vaga de familiares e amigos. Sendo que, em simultâneo, a imigração mais qualificada parou. “Hoje é de esperar inclusive uma retracção do fluxo migratório brasileiro global, muitos regressaram e outros vão regressar. A imigração qualificada não é significativa, porque no actual momento da economia brasileira há emprego qualificado no país de origem”.

Questionados sobre a integração na comunidade portuguesa, a maioria dos respondentes avalia este item pela positiva , com 56% das respostas a dizerem que os brasileiros estão integrados e 36% a considerarem o inverso. Uma nota negativa fecha este primeiro painel, com 64% a considerarem que os imigrantes brasileiros não são credíveis e fiáveis e 21% a pronunciarem-se pela resposta positiva.

“A comunidade brasileira está, de facto, muito bem inserida, curiosamente serão até mais participativos em Portugal do que no Brasil”, afirma Raquel Patrício. Uma análise que cola também com a pergunta sobre o nível de participação da comunidade brasileira face a outras comunidades imigrantes, com 49% a considerar ser mais participativa (35% considera igual às demais).

O segundo painel de questões prendeu-se com o nível de vida. E aqui a maioria das respostas foram no sentido de Portugal oferecer aos imigrantes brasileiros um padrão de vida superior ao que teriam no Brasil (72%). O que pode já não corresponder exactamente à realidade. “Nos mandatos Lula, sobretudo no segundo, assistimos ao aparecimento de uma classe média brasileira que resulta não do empobrecimento das classes altas, mas do enriquecimento das classes mais baixas”, refere a investigadora do ISCSP.

Esta classe média, continua, foi o grande alvo de “políticas sociais muito criativas, como a Bolsa Família, que atingiu 11 milhões de famílias, a Bolsa Escola, que ofereceu lanche na escola,a Cesta Básica e o programa Luz para Todos”. Para além da elevação do nível de vida, esta mudança na sociedade é hoje um forte motor da economia, porque é esta classe média que consome os produtos nacionais, que por sua vez fazem “mexer” a economia, enquanto as classes mais altas ainda consomem muitos produtos de importação.

Se, das respostas ao inquérito, se retira a conclusão que, para os portugueses, os brasileiros ainda vivem melhor em Portugal do que no Brasil, também é verdade que os mesmos inquiridos consideram, de forma muito expressiva, que o gigante do outro lado do Atlântico deu mesmo um grande salto nos últimos 10 anos. Questionados sobre o estádio de desenvolvimento actual do Brasil, reina quase unanimidade: 83% consideram hoje o Brasil um país mais desenvolvido que há 10 anos.

A imagem que os media transmitem da comunidade brasileira é vista, maioritariamente, como “neutra” (42%), ainda que 36% das respostas afirmem ser “negativa”. O que poderá, de alguma forma, ter impacto na associação da comunidade brasileira em Portugal a fenómenos de marginalidade, outra das questões no inquérito. A maioria dos respondentes estabelece essa associação (62%), mas cerca de 1/3 responde que não (33%). “Segundo dados da Polícia Judiciária, há correlação entre o crescimento da imigração brasileira e o aumento do número de crimes com armas de fogo. O que obviamente não pode ser generalizado à comunidade”, ressalva Raquel Patrício.

SAPO Notícias
02 de Outubro de 2010





Inquérito SAPO/Netsonda: Como os portugueses vêem os brasileiros?



Ficha Técnica do Inquérito SAPO/Netsonda

Sondagem: Como os portugueses vêem os imigrantes brasileiros em Portugal

Nº de respostas: 5318

Data de início: 2010-09-27

Última Resposta: 2010-10-01

Nota: Este inquérito foi conduzido online, o que significa que as respostas foram obtidas de forma voluntária, aberta e não monitorizada. Esta metodologia não permite definir amostras representativas, devendo por isso ser considerada a essa luz. A plataforma da Netsonda garante que cada pessoa pode apenas responder uma vez.
02 de Outubro de 2010


Lula da Silva, super-star também em Portugal


Na lista dos brasileiros que os portugueses melhor conhecem, o presidente Lula destaca-se de todos os outros nomes. Uma lista onde Jorge Amado marca pontos, dividindo atenções com Pelé e Roberto Carlos, entre outros.

Se há 10 anos perguntássemos aos portugueses que personalidades brasileiras melhor conheciam, seria natural ter uma lista encabeçada por actores, cantores e futebolistas. E esses nomes continuam (re)conhecidos, mas hoje são ultrapassados pela estrela maior do Brasil, o seu presidente Lula da Silva.

A última questão do inquérito SAPO/Netsonda era de resposta aberta e pedia que os respondentes indicassem os nomes que mais se destacavam no Brasil. E Lula da Silva é o grande destaque, quase unânime. “Ele é e será um símbolo do Brasil”, diz Raquel Patrício.

Um sucesso que começa dentro de casa: “afinal quem mais consegue 80% de taxa de popularidade interna em final de segundo mandato?”. A estratégia de Lula é “cuidar de dentro e virar-se para fora”.Queria colocar o Brasil no mapa-mundo e colocou. Um fenómeno de popularidade que também chega a Portugal.

Dos outro nomes, destacam-se Jorge Amado, afinal ainda bem presente na memória dos portugueses, Pelé, Roberto Carlos, Ayrton Senna, Chico Buarque, Caetano Veloso, futebolistas como Ronaldo e o novíssimo David Luís. Surpresa mesmo a passagem super-discreta de Scolari nesta lista de respostas.


SAPO Notícias
02 de Outubro de 2010

Saturday, October 2, 2010

PERFIL DOS PRINCIPAIS PRESIDENCIÁVEIS DE AMANHÃ

PERFIL DOS PRINCIPAIS PRESIDENCIÁVEIS DO BRASIL 2010

DILMA ROUSSEFF:

Economista de 62 anos, Dilma Rousseff nasceu em Minas Gerais, filha de um emigrante búlgaro, vivendo numa família de classe média alta.
Envolvendo-se politicamente desde estudante, lutando contra a ditadura, integrou duas organizações de esquerda: o Comando de Libertação Nacional (COLINA) e a Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR Palmares), tendo estado presa de 1970 a 1972, quando foi torturada com choques eléctricos.
Depois de libertada, reconstruiu a sua vida no Rio Grande do Sul com o seu companheiro de mais de trinta anos.
Ocupou diversos cargos na Administração Pública, dentre os quais o de Secretária Municipal da Fazenda de Porto Alegre e o de Secretária Estadual de Minas e Energia, tornando-se depois, no Governo Lula, Ministra de Minas e Energia, antes de ocupar, em 2005, o cargo de Chefe da Casa Civil do Presidente, do qual se demitiria no início de 2010 para se candidatar às presidenciais de amanhã.
Lula dá-lhe os louros pelo sucesso de vários projectos de desenvolvimento económico que permitiram o avanço do Brasil, tanto interna quanto externamente, embora os críticos lhe apontem diversas fragilidades. Para além do temperamento difícil, afirmam que Dilma é uma funcionária pública de carreira, sem percurso político de destaque (embora tenha ajudado na fundação do Partido dos Trabalhadores, PDT). Acrescentam que Dilma nunca foi eleita para nenhum cargo, tampouco se propôs a eleição, integrando o PT apenas desde 2001.
Prometendo «dar continuidade ao governo do Presidente Lula», Dilma afirma que pretende aprofundar o esforço ao nível do desenvolvimento social do Brasil, de modo a que o país transite de «emergente» a «desenvolvido». Tendo sido considerada, em 2009, pela revista Veja, uma dos cem Brasileiros mais influentes nesse ano, assenta seu programa de promessas governativas na distribuição da renda, no aumento do emprego, na melhoria do saneamento, na habitação e na educação.


JOSÉ SERRA:

Economista de 68 anos, José Serra nasceu em São Paulo, no seio de uma família pobre de emigrantes de origem italiana.
Era líder da União Nacional dos Estudantes quando se deu o golpe de 31 de Março de 1964, o que o forçou ao exílio. Viveu no Chile e nos EUA, onde concluiu os estudos em Economia, tendo regressado ao Brasil em 1977.
Foi um dos fundadores do PSDB em 1988. Deputado e senador, foi depois Ministro do Planeamento de Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 1996, tendo, de 1998 a 2002, ocupado o cargo de Ministro da Saúde, durante o qual, em função da políticas anti-SIDA assentes no acesso a medicamentos genéricos mais baratos, mereceu diversos elogios internacionais.
Tendo perdido as presidenciais de 2002 frente a Lula, foi, em 2004, eleito Presidente da Câmara de São de Paulo e, depois, Governador do estado de São Paulo. Deixou o cargo no início de 2010 para se poder candidatar às presidenciais de amanhã.
Criticado por ser demasiado centralizador, pessoa que dificilmente delega e, quando o faz, quer acompanhar de perto todos os processos, Serra pretende «reforçar aquilo que está bem e corrigir e melhorar o que não está», o lema de campanha que não enfrenta o ainda Presidente Lula, cuja gestão lhe mereceu, aliás, rasgados elogios. É facto que, se Dilma se colou sempre à imagem do seu protector, também Serra não lhe mereceu grandes críticas. Na verdade, pode bem dizer-se que ambos os presidenciáveis estão na sombra de Lula. Nas promessas eleitorais, a sua área de eleição é a Saúde, na qual obteve mais êxitos. Propõe-se, assim, construir mais hospitais e apostar na prevenção e na maior disponibilização de consultas e cirurgias. Ainda assim, promete também, ao nível das infra-estruturas, melhorar as estradas do país e utilizar o modelo de portagens que aplicou, com sucesso, em São Paulo.

Friday, October 1, 2010

As Eleições Brasileiras de Domingo

AS ELEIÇÕES BRASILEIRAS

É já no Domingo que mais de 134 milhões de eleitores Brasileiros vão às urnas escolher o sucessor de Lula, assim como os governadores dos estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores.
Interessante verificar, entretanto, a reviravolta que se tem processado ao nível das preferências da população relativamente ao novo presidente da República.
Até Julho/Agosto, as sondagens indicavam um empate técnico entre os dois principais candidatos: José Serra, do PSDB de Fernando Henrique Cardoso, e Dilma Rousseff, do PT de Lula. Em Abril, as sondagens davam 32% dos votos a Dilma e 40% a Serra, enquanto em Maio o empate fixava-se nos 37% para cada um. No início de Junho, Dilma chegou a ter 40% das preferências do eleitorado e Serra 35%, voltando o empate a surgir, no fim desse mês, nos 39%.
A partir de Julho, todavia, as variações caminhariam sempre no sentido do aumento de intenções de voto para Dilma e de diminuição para Serra, sendo de registar que, constante nos 8-9% entre Abril e o início de Setembro, Marina Silva, do Partido Verde (PV), subiu para 12%, de acordo com as sondagens do Ibope de meados de Setembro.
Na verdade, é Marina Silva quem mais se tem destacado no aumento das intenções de voto de Agosto até hoje, tendo passado dos 7% em finais de Agosto para 12% em meados de Setembro.
Significativo que, no último debate televisivo entre os candidatos, promovido Quinta Feira (30 de Setembro) pela Rede Globo, foi Marina Silva quem mais se destacou pela veemência do discurso inflamado (com que aliás já nos habituou). Embora o debate tenha sido morno, com Dilma e Serra a evitar o confronto bilateral e a jogar à defesa, optando, a primeira, por espicaçar Plínio Arruda, do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) e Marina, e o segundo por confrontar apenas Marina, a candidata do PV destacou-se também ao solicitar ao eleitorado que leve as eleições a segunda volta – o que cada vez se torna mais provável, embora há um mês não parecesse esse o caminho que tomariam as eleições de 3 de Outubro.
De facto, segundo as mais recentes sondagens, que têm vindo a realizar-se desde o início de Setembro, Dilma já passou de 51% (no início desse mês) para 50% (em meados do mês), situando-se hoje nos 49%, depois do debate de ontem. Isto tem resultado de uma clara migração de votos para Marina Silva, a candidata que mais cresce nas sondagens desde Agosto. Assim, bastam a Marina 3 ou 4 pontos percentuais para destronar a maioria absoluta de Dilma. E, se esta conseguir apenas 45-46% dos votos, como já foi cogitado, as eleições serão levadas a segundo turno a 31 de Outubro, entre Dilma e Serra.
As sondagens desta última semana têm sido mais sorridentes a Dilma, embora o espectro de uma segunda volta se mantenha, para o Instituto Datafolha, que, a 29 de Setembro, conferiu 52% a Dilma, 31% a Serra e 15% a Marina. O Ibope e o CNT/Sensus apresentam preferências de voto mais apelativas ainda para a candidata de Lula, segundo sondagens divulgadas a 28 de Setembro. Para o Ibope, Dilma segue à frente com 55%, seguida de Serra com 30% e de Marina com 14%. Para o CNT/Sensus, os dados revelados também no dia 28 são semelhantes: Dilma com 54,7%, Serra com 29,5% e Marina com 13,3%.
As sondagens têm apresentado oscilações nem sempre fáceis de interpretar. Fala-se mesmo de uma «guerra de sondagens», pois tão depressa Dilma surge como a grande vencedora logo na primeira volta, como se dá como certa uma ida a segundo turno, em função de algumas quedas que Dilma apresenta por vezes, que não têm afectado Serra, enquanto Marina continua a aumentar. Daí o espectro da segunda volta. Por outro lado, tomando em consideração as margens de erro das sondagens, que giram em torno dos 2 pontos percentuais, em alguns casos a vitória de Dilma a 3 de Outubro é posta em causa. Tomando como exemplo a sondagem do Datafolha acima mencionada, se a margem de erro de 2% se confirmasse, Dilma ficaria com apenas 50%, não alcançando os 50% mais um dos votos válidos para fazer eleger-se na primeira volta.
As margens estão, pois, muito reduzidas. A migração de votos para Marina e a diminuição dos votos nulos ou brancos nas sondagens, de 8% para 4%, segundo sondagem do Datafolha de 30 de Setembro, não animam o panorama para a candidata do PT.
Em caso de se ir a uma segunda volta, as últimas sondagens do Ibope, CNT/Sensus, Datafolha e Vox Populi dão a maioria absoluta a Dilma, com 55% dos votos, ficando-se José Serra pelos 38% (e os votos nulos ou brancos em 7%). Também nestas simulações de uma eventual segunda volta, Dilma vem crescendo significativamente desde Agosto. Até Julho, a diferença entre os dois candidatos era de 1-2%: em Maio registavam-se 46% para Dilma e 47% para Serra; em Junho 45% para Dilma e 45% para Serra e, em Julho, 46% para a primeira e 45% para o segundo. A partir de Agosto, a diferença foi-se alargando, chegando Dilma a ter, na sondagem referente aos dias 13 a 15 de Setembro, 57% e Serra apenas 35%. Ou seja, uma vantagem, para Dilma, de 22% sobre Serra. Na sondagem referente aos dias 21 e 22, essa vantagem baixou para 17%. Certo é que Fernando Henrique Cardoso já afirmou que, em caso de uma segunda volta, tudo fará para estabelecer uma ponte entre o seu candidato e Marina.
De alguma forma, estes resultados mostram que os escândalos envolvendo a Casa Civil do Presidente Lula, que levaram à resignação da Chefe da Casa Civil Erenice Guerra, não afectaram grandemente Dilma. A corrupção e o lobby da Casa Civil foram fortemente criticados pelos votantes das classes mais instruídas e de renda alta – uma fatia muito pequena do eleitorado brasileiro – mantendo-se todavia a preferência por Dilma nas restantes classes sociais.
Mas as eleições de 3 de Outubro e, se necessário, de 31 de Outubro, não são apenas para escolher o sucessor do carismático Lula. Os mais de 134 milhões de eleitores serão também chamados a escolher novos governadores para os estados, 2/3 dos deputados estaduais e federais e 2/3 dos senadores, de acordo com o sistema eleitoral brasileiro. Haverá, em consonância, a composição do governo que se espera, desde logo, vir a ser muito eclético, com uma base de suporte que irá do PT ao PCdoB (Partido Comunista do Brasil), passando pelo incontornável PMDB – o maior e mais constante vencedor das eleições estaduais e legislativas. Por uma razão muito simples: como não apresenta candidato à Presidência da República desde 1984, as negociações e as compensações em troca de apoios rendem-lhe sempre posições favoráveis e confortáveis, designadamente ao nível de grandes pastas do governo. Este facto é tanto mais verdadeiro quanto, em nome da nomeação de Dilma, Lula teve de conceder compensações. Afinal, enquanto Lula é fundador do PT, Dilma só se filiou no partido em 2001, o que constituiu um motivo forte para que muitas lideranças do PT criassem barreiras à indicação de Dilma. De alguma forma, Dilma terá sido «imposta» por Lula ao PT, sem possuir, nem capital político, nem o carisma de Lula. Além da margem de aprovação popular de Lula de 80%, segundo as últimas sondagens, Dilma nunca disputara antes qualquer pleito, enquanto Lula já se candidatara a presidente três vezes antes de ser eleito em 2002.
Estas condicionantes seguramente limitarão os alcances do PT nas eleições extra-presidenciais e, evidentemente, na composição do governo, onde se espera vir a ter uma participação menor. Ainda assim, cogitam-se, para a pasta da Fazenda, António Palocci, Guido Mantega ou Luciano Martinho. O que demonstra, claramente, a intenção, já muito anunciada por Dilma, de seguir o caminho da continuidade relativamente à Administração Lula. Em relação à Fazenda, de qualquer forma, quer ela, quer mesmo Serra, pouco poderiam inovar. Para além do próprio Serra ter tecido rasgados elogios a Lula durante a campanha eleitoral, não sendo de esperar que elaborasse grandes alterações, o Brasil tem regras relativas aos fluxos financeiros que tem de cumprir. E se já a política de Palocci e, depois, de Mantega, fora idêntica à de Pedro Malan do governo FHC, para os próximos quatro anos o cenário manter-se-á inalterado. Ademais, o sistema político brasileiro difere dos modelos anglo-saxónicos. Nestes, para que o candidato vença, tem de apregoar a mudança. No Brasil, a vitória é assegurada se apelar à continuidade. O que aliás explica a preferência do eleitorado por Dilma, ainda que, se esta está na sombra de Lula, o mesmo se pode dizer de Serra, para o qual atacar o ainda presidente seria dar um tiro no próprio pé. Já para a pasta das Relações Exteriores o nome mais falado é o do ex-Secretário Geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, que abandonou o cargo por ter completado 70 anos. Mas para ser ministro não existem limites etários.
Não esquecer, ainda, que o vice-presidente será do PMDB. O anterior vice-presidente, José de Alencar, empresário, era uma personalidade controversa, tendo mesmo defendido a bomba atómica (embora não tenha sido o único) e, ademais, oriundo de um partido pouco expressivo. Ao contrário, Michel Themer está bem posicionado. E deixará o PT em sérias dificuldades no caso de ter de assumir no lugar de Dilma que, embora tenha sido já dada como curada, persistem dúvidas quanto à sua capacidade física para liderar o Brasil herdado de Lula.
Para os quatro mais importantes estados do Brasil: São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, esperam-se, respectivamente, as vitórias, para governador, de Geraldo Alckmin (PSDB), com 49%, frente a Aloísio Mercadante (PT), com apenas 27%; António Anastasia (PSDB), com 52% frente aos 43% de Hélio Costa (PMDB); Tarso Genro (PT), com 52% face a José Fogaça (PMDB), com 25%, e Yeda Crusius (PSDB), com apenas 15%; e de Sérgio Cabral (PMDB), com 67% contra os 21% de Fernando Gabeira (PV).
Vale lembrar que a lei eleitoral brasileira utiliza o pior sistema de representação proporcional de deputados eleitos: o sistema de lista aberta, de acordo com o qual os eleitores podem votar no partido ou num indivíduo de um partido. Em 95% dos casos em que os eleitores votam em nomes individuais, desconhecem a proveniência partidária dos candidatos. Até porque, muitas vezes, os próprios candidatos, na campanha eleitoral, omitem a sua referência partidária e apenas apresentam o nome, a fotografia e o número de código.
Este sistema de votação em nomes individuais tem levado ao aparecimento de candidatos, no mínimo, exóticos, mas que atraem camadas de eleitores, como por exemplo o humorista Tiririca, que se espera vir a obter cerca de 1 milhão de votos para o Senado. Recentemente, um artigo da BBC apelidou estes candidatos de «wacky». Além de Tiririca, são exemplos curiosos de candidatos a «Mulher Pêra» e a «Mulher Melão», sendo de ressaltar que também desportistas como Romário, Popó e Maguila se candidatam, assim como cantores como Netinho (candidato a senador por São Paulo, através do PCdoB) e Sérgio Reis.